Entre o passado e o presente da cultura negra em Porto Alegre

Quilombo Areal da Baronesa resiste e mantém viva a luta do povo que neste 20 de novembro celebra o Dia da Consciência Negra, data da morte de Zumbi dos Palmares

Eduarda Wisniewski

TEXTO: Felipe Silva Teixeira e Gustavo Fontella – Originalmente publicado em 20/11/2023 (Medium Lab J).

Quilombo Areal da Baronesa é localizado em rua sem saída em área urbanizada | Foto: Felipe Silva Teixeira

Localizado na Avenida Luiz Guaranha, entre os bairros Cidade Baixa e Menino Deus, o Quilombo Areal da Baronesa é símbolo de resistência e preservação da cultura afro-brasileira na capital gaúcha. Suas origens remontam ao século XVIII, quando a região era uma chácara semi-rural.

Com o tempo, o Areal se tornou um importante reduto da cultura negra na cidade. Ali proliferaram casas de religião, blocos carnavalescos, rodas de samba e artistas populares, formando uma cultura característica. O bloco carnavalesco mais antigo de Porto Alegre, o Bambas da Orgia, foi fundado no Areal da Baronesa na década de 1930. O samba também é uma forte expressão da cultura do quilombo, que sedia anualmente o Arraial do Areal, uma das maiores festas de rua do país. Atualmente, o Quilombo Areal da Baronesa é habitado por cerca de 80 famílias.

Quilombo Areal da Baronesa é berço do Carnaval da capital gaúcha | Foto: Felipe Silva Teixeira

A equipe do Lab J conversou com Fabiane Xavier, líder comunitária do Quilombo Areal da Baronesa, sobre a preservação das tradições culturais e históricas. Segundo ela, a transmissão desses valores ocorre, principalmente, de forma oral, por meio de ações afirmativas dentro da própria comunidade. Oficinas na associação comunitária, reforço escolar e aulas de dança são algumas das atividades que buscam envolver as gerações mais jovens na rica cultura negra presente no quilombo. “O pessoal aqui é muito unido, então existe uma relação de comunidade bastante forte. Crianças, jovens, adultos e idosos sempre estão juntos”, destaca Fabiane. No entanto, ela também observa mudanças ao longo do tempo, especialmente devido ao acesso rápido à informação e à crescente conectividade das crianças à internet.

A relação entre o quilombo e a cidade é marcada, nos últimos anos, pela urbanização. Situado entre os bairros nobres Cidade Baixa e Menino Deus, o Areal da Baronesa enfrentou desafios relacionados à especulação imobiliária. Foram necessários 20 anos para obter o título de propriedade, enquanto a área verde do local diminuía com o avanço das construções. Atualmente, o quilombo é uma rua sem saída de apenas 300 metros. “Era uma área que tinha muitas árvores no entorno. Com a especulação imobiliária, o verde foi diminuindo”, lembra Fabiane.

Fabiane Xavier, líder comunitária do quilombo, fala sobre as mudanças culturais entre gerações | Foto: Gustavo Fontella

Outro problema reclamado pela comunidade era em relação à segurança. Nos últimos anos, no entanto, a líder comunitária afirma que a atuação mais presente do Comando de Policiamento da Capital da Brigada Militar na região levou mais tranquilidade. “Hoje está bem mais tranquilo em comparação há alguns anos”. Para manter a estrutura do quilombo, Fabiane revela que tudo é feito de forma interna, pelos próprios moradores. “A comunidade tira recursos do próprio bolso para evoluir e participar de projetos com parceiros privados. Procuramos evitar parcerias governamentais, pois o quilombo é apartidário”.

O dia 20 de novembro, cuja data faz referência à morte de Zumbi dos Palmares, foi instituído oficialmente Dia da Consciência Negra pela Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011. Zumbi era líder do Quilombo dos Palmares — hoje conhecido como União dos Palmares, em Alagoas — e foi morto em 1695.