Feiras movimentam economia da agricultura familiar 

Privilegiando produtos orgânicos sem veneno, Feira Ecológica do Bom Fim completou 40 anos

Andrei dos Santos Rossetto

Reportagem de Ana Carolina Borba Nazario 

Feira Ecológica do Bom Fim celebra 33 anos de existênciaFoto: Ana Carolina Nazario

As feiras de rua já se tornaram tradição tanto nas pequenas quanto nas grandes cidades brasileiras. O evento é a principal forma que os pequenos e médios agricultores possuem de expor seus produtos para o grande público, se tornando a principal fonte de renda das famílias produtoras.  

Porém, os agricultores não se limitam em apenas apresentar seus produtos para o público. Eles compartilham também suas histórias e experiencias de vida. Cada banquinha tem uma história para nos contar.  

Juarez Antônio Felipe Pereira, um pequeno agricultor de arroz de 69 anos, compartilhou a sua visão sobre a importância cultural da feira: 

“É fundamental. Porque ela orienta minha produção para tipos de arroz, eu trabalho aqui com oito tipos. A feira é um encontro semanal, ela é formadora, formadora de ideias, formadora de cultura”, diz Pereira.   

Gabriel, um jovem de 24 anos, compartilhou sobre a história de sua banca, fruto de uma família de assentados do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). “Podemos pautar em duas grandes áreas de atuação do movimento. A primeira área de alimentação e a outra é a área de capacitação, formação e educação ambiental. Acho que são duas áreas muito fortes que o movimento atua, tanto que o movimento é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina”, explica Gabriel. As bancas do MST abrangem diversos produtos, não apenas hortaliças ou hortifrútis, possuem pães, arroz, grãos e sementes. 

No final de agosto foi realizada a comemoração dos 33 anos da Feira Ecológica do Bom Fim. A feira estreou em agosto de 1991, com foco na venda de produtos orgânicos diretamente do produtor ao consumidor. Os produtos orgânicos são cultivados sem veneno. O evento estava cheio e com várias atrações, como shows ao longo do dia e oficinas interativas. Um público bem diversificado, tanto jovens quanto pessoas de mais idade, estava presente. 

As feiras são o principal meio de adquirir produtos livres de agrotóxicos, proporcionando uma alimentação saudável para o consumidor.  

Reforma agrária e agricultura familiar 

A agricultura familiar é responsável atualmente por 67% das ocupações do campo, segundo dados de 2024 da Contag (Confederação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares). A prática colabora para assegurar a segurança alimentar e nutricional da população brasileira.  

No Brasil, a história da agricultura familiar está interligada com a atuação do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), que completou 40 anos de existência em 2024. O MST é o principal movimento camponês do país e um dos maiores da América Latina. Sua história se inicia na década de 1980. Seus pioneiros, ao perceberem a quantidade de terras sem uso espalhadas pelo Brasil assentaram-se e distribuíram para famílias de pequenos trabalhadores rurais sem terras próprias. Atualmente, cerca de 450 mil famílias conquistaram a terra por meio do movimento, segundo o próprio MST. 

Os assentamentos do MST têm uma importância tanto cultural quanto econômica para o nosso estado, contribuindo ativamente na economia, principalmente das pequenas regiões. O deputado estadual Adão Pretto (PT) comentou do caso da região de Águas Claras, na área rural de Viamão, que evidencia essa mudança econômica graças ao assentamento existente na cidade. 

“Eles falaram que quando chegaram aqui, os acampados naquela época, tinha meia dúzia de comércio. Hoje, o comércio de lá tem mais de 100 lojas vendendo bem. A gente tem muito nítido que o desenvolvimento dessa região foi graças àquelas famílias que chegaram aqui, que compraram o material para construir a sua casa, vieram no comércio gastar aqui. Ou seja, onde tem assentamento, além da produção de alimento, muitos municípios pequenos se desenvolveram graças aos assentamentos. Então desenvolve a economia do município da região e daquelas famílias que estão ali produzindo e também consumindo no comércio local”, diz o deputado Adão Pretto (PT). 

Historicamente, o MST é alvo de ataques da extrema-direita e setores da economia, não apenas do setor agrícola. Devido ao aumento da disseminação de fake news no Brasil, espalham-se discursos que acusam os integrantes do movimento de invasores e bandidos que “roubam” as terras alheia. Porém, quando as terras ociosas são desapropriadas, os proprietários recebem a devida indenização.  

 “Infelizmente, ao longo dos anos vimos um preconceito da grande mídia e dos setores grandes da sociedade, que tentam carimbar o MST como terroristas. Não tem nada disso, muito pelo contrário. O movimento tem um trabalho de extrema importância social e econômica, gerando empregos e movimentando a economia”, explica Pretto.   

No governo anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro (2018-2022), foram reduzidos os investimentos para pequenos e médios agricultores, cortado o crédito para a agricultura familiar e deixado de comprar terras para a reforma agrária. Dados da Agência Pública mostram que em 2019, a gestão Bolsonaro destinou R$6 milhões para a agricultura familiar. A quantia equivalia a menos de 0,2% do orçamento Ministério da Agricultura. No ano seguinte, ainda de acordo com a Agência Pública, o valor caiu ainda mais, para  R$1,2 milhões, menos de 0,1% da verba total daquele ano. 

Reportagem produzida para a disciplina de Reportagem e Entrevista, sob supervisão da professora Paula Sperb.