Infração ambiental: gato foi enterrado em via pública por trabalhadores da obra do Zaffari 

Ato flagrado pela equipe do Lab J levanta mais questionamentos sobre a retirada dos animais que habitam o local

Fernanda Nascimento

Por Anita Ávila

Foto: Pedro Pereira

Um gato doméstico foi enterrado na via pública, em frente ao novo loteamento do Zaffari, pelos trabalhadores da construção. De acordo com a Lei de Crimes Ambientais, o ato é considerado uma infração e está sujeito a multa. O episódio foi flagrado pelo Laboratório de Jornalismo da Famecos (Lab J) durante a apuração de denúncias de irregularidades na obra do Bourbon Jardim Itália, no Jardim Itú Sabará, em dezembro

O enterro de animais em vias públicas pode causar danos ao meio ambiente e à saúde pública, pelo risco da disseminação de doenças e pragas. A prefeitura de Porto Alegre disponibiliza em seu site um serviço de atendimento de demandas relacionadas aos serviços públicos municipais. Conforme o advogado e especialista em Direito Animal Rogério Ramme, a atitude adequada é o recolhimento. “É condizente com a legislação que vai exigir que tu ligue para a prefeitura e a prefeitura venha recolher o corpo daquele animal”, comenta. 

A Equipe de Fauna do Grupo Zaffari, responsável pela captura dos graxains que habitam a área – único animal com plano de manejo na obra -, afirmou em nota que a retirada não foi realizada por seus funcionários. “A empresa lastima o ocorrido e informa que apurou ser um animal (gato) que foi atropelado na via pública de grande fluxo, e que foi retirado do local por dois colaboradores da prestadora cadastrada junto à municipalidade para execução de obras públicas que estão trabalhando na realização das melhorias e no alargamento viário”.

Mesmo se eximindo da responsabilidade, a empresa informou que “irá solicitar à equipe de fauna a remoção e a correta destinação do corpo do animal. E irá solicitar à empresa contratada que inclua em seus programas de treinamento e orientação aos seus colaboradores este tipo de ocorrência, completando, assim, os cuidados mais adequados e revisando o ocorrido”.

Conforme o inquérito que investiga denúncias de irregularidades na obra, em 2022, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade de Porto Alegre (SMAMUS) enviou à empresa recomendação de treinamento e cuidado especial tanto com animais domésticos quanto silvestres. O Lab J entrou em contato com a para um posicionamento do órgão diante do caso, porém não obteve retorno. 

Silêncio, descuido e despreparo

O sigilo de informações e a rapidez demonstrada pela empresa em concluir a obra desagrada e revolta a comunidade. “É um crime ambiental que estão fazendo ali. É só horror”, comenta Elaine Rodrigues, moradora do bairro.

A naturalidade com que os trabalhadores deram um destino ao corpo do animal chama a atenção. “Isso levanta alguns questionamentos se não é isso que tem acontecido com todos os animais”, lamenta a advogada Ester Freitas, integrante do movimento S.O.S Sabará, que tem questionado a maneira como a obra tem sido conduzida.

A situação do plano de manejo e a captura dos demais animais silvestres que vivem no local segue sendo uma incógnita. Até então, apenas os graxains possuíam o plano de manejo – que inicialmente apresentou falhas e incapacidade de concluir as capturas no prazo planejado. “Tem que ter o compromisso do empreendedor com o resgate da fauna. É inconcebível que no atual estágio, onde a obra já está sendo realizada, que não se tenha um levantamento das espécies que ali se encontram”, retoma o advogado Rogério Rammê.

A empresa afirma que há a previsão de campanhas de fiscalização da obra a cada três meses e encaminhamento dos animais para locais adequados. “A equipe de biólogos promove o direcionamento desses animais, procurando encaminhá-los para lugares mais seguros, como nas próprias áreas preservadas e cercadas do empreendimento”

Os moradores frequentemente mantinham contato com a bióloga responsável pela captura dos graxains, com o objetivo de garantir a transparência no tratamento dos animais que habitavam a área. Quando questionada sobre os métodos de resgate e o aparecimento de outros animais nas vias públicas, a bióloga esclareceu que a Equipe de Fauna não se responsabilizava pelo resgate de animais fora da área de captura definida pela empresa. “Estava aparecendo muito animal aqui ao redor. Disseram para soltar direto no mato. Falaram que não se responsabilizariam se aparecesse algum animal fora da área definida”, afirma Elaine.

A comunidade, junto com o grupo S.O.S Sabará, continuou tentando manter o contato com a bióloga. No entanto, os moradores relatam que após a repercussão do novo loteamento e as denúncias relacionadas à obra, os funcionários deixaram de fornecer informações tanto sobre a obra quanto sobre os animais.