Mudanças climáticas impactam mobilidade urbana de Porto Alegre

“Não tem como dissociar meio ambiente e mobilidade urbana. Quando a cidade alaga, o transporte público para e o tráfego trava”, afirma professor da PUCRS

Jornalismo Especializado

Prefeitura usa inteligência artificial para mapear a qualidade dos pavimentos nos mais de 3.400 quilômetros de vias da cidade | Foto: Alex Rocha/PMPA

Por Carlo Amoretti

O efeito das mudanças climáticas atinge mais do que o meio ambiente. O transporte urbano é diretamente prejudicado pelos danos em infraestrutura causado pelas fortes chuvas que vem assolando o Rio Grande do Sul desde 2024.

A enchente do ano passado e as recentes chuvaradas deixaram muito mais do que um rastro de destruição: os fenômenos climáticos escancararam as fragilidades na mobilidade urbana de Porto Alegre.

A Trensurb, meio de transporte que liga a capital à Região Metropolitana, parou durante a enchente. As linhas de ônibus foram completamente alteradas. Diversas ruas ficaram interditadas. Os impactos do clima na infraestrutura da cidade ainda são visíveis nos mais de 3.400 quilômetros de ruas e avenidas.

Essas condições afetam quem circula por diferentes regiões diariamente. “A sensação é de que é um asfalto de baixa qualidade”, afirma Thomaz Campos, que roda pelas vias da cidade há mais de cinco anos como motorista de aplicativo.

A pavimentação em Porto Alegre é uma das responsáveis pela deterioração das ruas. O asfalto, apesar de muito utilizado na capital, é um material considerado “ultrapassado” por ser altamente deformável, especialmente quando em contato com o peso de veículos de grande porte, como caminhões e ônibus. Além disso, ele prejudica a absorção da água das chuvas.

A qualidade das vias não depende apenas dos materiais utilizados, mas também de fatores ambientais.

Hoje, já sabemos que o tipo de pavimento que usamos não foi pensado para essas condições climáticas. É um asfalto que sofre com a água, com o calor e que precisa ser reavaliado constantemente”, explica Laurence Morfeu Tavares, professor da PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul) com pós-doutorado em Engenharia Civil pela Unisinos (Universidade do Vale do Rio dos Sinos).

Tavares menciona que, em épocas de chuvas fortes, como a enchente de maio, a água pode causar erosão no pavimento, afetando ainda mais as ruas.

Para enfrentar esse cenário, a prefeitura de Porto Alegre iniciou, em outubro de 2024, o uso de um sistema de mapeamento com veículos equipados com inteligência artificial para diagnosticar o estado das vias. O Sistema de Gestão Integrada de Pavimentos de Porto Alegre (Gipav-POA) tem como objetivo identificar as condições das ruas e direcionar investimentos para os locais mais críticos da cidade.

Até o momento, já foram percorridas 52% da malha viária da cidade, o que representa cerca de 2 mil quilômetros. De acordo com o levantamento, 46% das ruas e avenidas mapeadas estão classificadas em ótimas/boas condições; 22%, condições regulares; e 32%, em mau estado.

Para o professor da PUCRS, os impactos das mudanças climáticas sobre a cidade ainda tendem a se intensificar. “Não tem como dissociar meio ambiente e mobilidade urbana. Quando a cidade alaga, o transporte público para e o tráfego trava”, afirma.

O professor reforça ainda que não basta consertar os problemas depois que eles aparecem, é necessário planejamento urbano. “A cidade precisa estar preparada para o que já está acontecendo. Não é só trocar o asfalto, é pensar em drenagem urbana, arborização, materiais mais resistentes. A mobilidade depende disso tudo”, aponta o arquiteto.