Copa do Mundo Feminina de 2023 expõe a disparidade midiática entre futebol masculino e feminino

Mesmo quebrando recordes no cenário esportivo global, a Copa do Mundo Feminina ainda apresenta grande diferença na disseminação de conteúdo em comparação com a masculina

Luciana Weber

TEXTO: Felipe Silva Teixeira e Gustavo Fontella- originalmente publicado em 01/08/2023 (Medium Lab J).

Seleção Feminina do Brasil — Copa do Mundo Feminina FIFA Austrália e Nova Zelândia 2023. / Fotografia: Thais Magalhães / CBF

A Copa do Mundo Feminina de 2023, sediada na Austrália e Nova Zelândia, é o evento mais importante da modalidade. No entanto, em levantamento realizado pela equipe do Lab J, é possível perceber que as principais emissoras brasileiras reduziram o tamanho de suas equipes enviadas para a cobertura do evento em comparação com a Copa do Mundo masculina, realizada em 2022. Dessa forma, nota-se que ainda há uma grande disparidade da atenção recebida pelo futebol feminino em relação ao masculino. O número de 70 profissionais levados para o Catar pelas emissoras analisadas diminuiu para 16 em 2023, uma redução de 77%.

Enquanto a Copa do Mundo masculina atraiu milhões de espectadores em todo o mundo e gerou enormes receitas publicitárias e patrocínios, a cobertura da Copa do Mundo Feminina é vista como uma oportunidade comercial menor pelas grandes emissoras e empresas. Isso se reflete não apenas no tamanho das equipes enviadas para a cobertura, mas também na quantidade de espaço dedicado aos jogos femininos nas grades de programação da TV aberta e nos principais espaços de destaque nos veículos de comunicação.

Doutora em Comunicação Social pela PUCRS, a professora do Curso de Jornalismo da Escola de Comunicação, Artes e Design Famecos Cristiane Finger Costa é pesquisadora de telejornalismo e gênero. Ela relata que o futebol e a mídia tradicional são movidos por dinheiro, e enquanto não houver investimento maciço e um grande interesse do público no futebol feminino, não será possível realizar coberturas de grandes proporções da modalidade. “As pessoas tendem a pensar que é uma questão de igualdade, mas não é. É, sim, uma questão de equidade. Ou seja, dar melhores condições para falar sobre o futebol feminino, que é pouco explorado nas redações da mídia tradicional e alternativa”, comenta a professora.

O Grupo Globo enviou para o Catar uma equipe com 27 profissionais no total, sendo apenas quatro mulheres — totalizando 14,8%. Essa estatística subiu para 50% em 2023, já que seis dos 12 enviados para Austrália e Nova Zelândia são mulheres. O Grupo Bandeirantes enviou 14 profissionais para a Copa do Mundo masculina em 2022, porém, não enviou ninguém para realizar a cobertura do evento deste ano. A ESPN optou por enviar uma equipe totalmente feminina para a Copa de 2023, com quatro profissionais no total, em comparação a uma equipe de 13 pessoas em 2022, em que apenas duas eram mulheres (15%). GZH enviou dois repórteres para a competição de 2023, um homem e uma mulher, em comparação com a equipe de 16 profissionais enviados ao Catar em 2022 em que duas eram mulheres, resultando em um percentual de 12,5%. A CazéTV enviou apenas uma repórter para a Oceania, em paralelo aos cinco enviados ao evento de 2022, que contava com apenas uma mulher, ou 20% de participação feminina.

Na Copa do Mundo masculina de 2022 foram transmitidos em TV aberta, pela Globo, 56 das 64 partidas da competição, contabilizando 160 horas de transmissão, além de mais 300 horas de transmissão no canal fechado SporTV. Na Copa Feminina deste ano, a Globo transmitirá em TV aberta apenas sete jogos da seleção brasileira, com algumas outras partidas sendo transmitidas pelo SporTV. Via streaming, a FIFA+, uma plataforma paga oficial do evento, transmitirá todas as partidas. A CazéTV transmitirá gratuitamente os jogos da Seleção Brasileira na Twitch e no Youtube.

A jogadora Marta falou justamente sobre o assunto na coletiva desta terça-feira, na Austrália, e se emocionou. “Sabe o que é legal? Eu não tinha um ídolo no futebol feminino. Vocês (imprensa) não mostravam o futebol feminino. Como eu ia entender que eu poderia ser uma jogadora, chegar à seleção, sem ter uma referência? Hoje a gente sai na rua e os pais falam. “Minha filha quer ser igual a você”. Hoje temos nossas próprias referências”. Apesar do aumento favorável da cobertura do futebol feminino citado pela craque Marta, parece ainda existir um longo trajeto a percorrer para que o futebol feminino alcance um patamar equilibrado em relação à transmissão de jogos do futebol masculino. “É uma persistência contínua”, disse Marta.