A revista Tição e a imprensa negra gaúcha

Revista da década de 70 retrata temais atuais do racismo no Brasil

Pedro Pereira

Reportagem por David Ferreira e Pedro Pereira

Reprodução / Júlia Dorigon

“Democracia Racial: lenta, gradual, relativa”. Por mais atual que pareça, esse é o título da segunda edição da revista Tição, publicada em agosto de 1979. O exemplar custava vinte cruzeiros. Hoje, a temática segue presente, e a pauta da consciência negra é destaque no Brasil de 2024. A Tição, fundada em março de 1978 por um grupo de jornalistas e comunicadores negros, possui três edições publicadas do projeto, sendo duas revistas, e uma terceira em formato de jornal impresso, em outubro de 1980. A revista tinha o objetivo de atingir a comunidade negra, evidenciando aspectos sociais e culturais no formato de notícias. Todas as edições da revista podem ser conferidas em uma exposição no saguão da Escola de Comunicação, Artes e Design da PUCRS (Famecos). 

“As pautas (da Tição) permanecem extremamente atuais. Trata-se de uma retomada da luta antirracista, que continua com a mesma estrutura hoje em dia”, comenta Emílio Chagas, 74 anos, jornalista e um dos fundadores da revista. O ativista negro revelou a intenção de produzir uma nova edição da revista. “Uma coletânea das três edições já postadas e comparar com as situações de hoje, problemas que pioraram e aqueles que estagnaram”, explicou. O jornalista também pretende produzir outras três edições em 2025, com temáticas como juventude negra e racismo estrutural. 

A exposição Revista Tição e a Imprensa Negra do RS é parte do projeto Semana Com Ciência Negra, organizado pela Escola de Comunicação, Artes e Design, em parceria da PUCRS Cultura. O evento tem como objetivo promover debates sobre a semana da Consicência Negra através de palestras, painéis e conversas com especialistas, pesquisadores e militantes do movimento negro.  O mostruário da Tição conta por painéis o processo de construção da revista, incluindo as capas das três edições e também de jornais que se inspiraram na Tição, como a Nação Z. Além disso, há QR Codes juntos aos documentos e arquivos na exposição que permitem ao visitante acessar o conteúdo completo das edições da Tição, além de materiais sobre a história das fontes entrevistadas pela revista.  

Uma das inspirações da Tição foi o pioneiro O Exemplo, jornal que circulou na capital gaúcha entre 1892 e 1930, servindo como base do arquivo e valorização da cultura afro-brasileira. Apesar da publicação de apenas três edições, os conteúdos da Tição foram reafirmados em movimentos de militância e temáticas negras no país.

Naiara Silveira, ativista do movimento negro e filha única do poeta e militante Oliveira Silveira, que também fez parte do projeto da Tição, defende e preserva a contribuição do pai para a revista e para a poesia brasileira. “Eu acompanhei todo o processo de criação da revista e toda essa caminhada do movimento negro do meu pai. Resgatar a Tição também é um resgate da história da imprensa negra no Rio Grande do Sul”.  

A Semana Com Ciência Negra terá conversas com diversos convidados até sexta (22). O mostruário da revista ficará no saguão da Famecos até dia 18 de dezembro.