Diversos tipos de arte em uma só Bienal: Artistas da 14ª Bienal do Mercosul rompem com padrões

A mostra internacional começa em Porto Alegre com o tema “Estalo”

Andrei dos Santos Rossetto

(Reprodução/Malu Gomes)

Por Alana Borges e Malu Gomes

Nesta edição, o evento está presente em 18 pontos de Porto Alegre e da Região Metropolitana, expondo a obra de 78 artistas de diferentes lugares do mundo. O evento estava previsto para acontecer em 2024, mas foi adiado por conta da enchente. Agora, o público pode visitar os espaços culturais até o dia 1º de junho.

O conceito de “Estalo” conversa com a ideia de como o movimento e a transformação acontecem rapidamente, em um estalar de dedos. É algo que se transforma, se move rapidamente, entre diversos tipos de arte, artistas e estilos. O curador-chefe do evento, Raphael Fonseca, explica, no podcast especial do LabJ sobre a Bienal, que optou por um título mais curto e que fosse amplo: “Estalo ficou muito bacana porque era uma palavra só, porque em inglês também funciona, ‘snap’ também tem muitos sentidos, ‘chasquido’ em espanhol também funcionava.” A concepção ainda flerta com a pluralidade da Bienal, que oferece palco para diversas nacionalidades e culturas.

Além disso, Raphael relembra que o projeto começou a ganhar forma em março de 2023. Portanto, a palavra “estalo” aparece como uma lufada de ar fresco, uma mudança e um renascimento, trazendo a ideia de um novo tempo, da vida de volta ao normal, onde todo tipo de arte tem seu espaço. Uma saída do período pós-pandêmico e de enchentes no Rio Grande do Sul para um ambiente onde todos têm espaço para criar.  

O curador-chefe também acrescenta que um dos focos desta edição é a  diversidade, tanto de estilos de arte quanto com a curadoria dos artistas: “diversos tipos de arte em uma só Bienal”, acrescenta Raphael. O objetivo é dar espaço e visibilidade a artistas que foram historicamente rebaixados.

A edição apresenta, ainda, trabalhos de diversos países, como Iraque, Bolívia, Taiwan, Tailândia e Turquia. Dos 76 artistas que integram a mostra, cerca de 65% são de fora do Brasil. Também fazem parte artistas de comunidades de povos originários, como a cineasta e artista visual Alanis Obomsawin, indígena Abenaki da região dos EUA e Canadá.

O Brasil tem 18 artistas. Embora se espere que, em um evento realizado no Brasil, o foco sejam os artistas locais, o curador-chefe tem uma visão oposta. Para o curador, “o Brasil é o começo, o meio e o fim de tudo. E que legal, porque é um país incrível, que tem artes incríveis, mas por que a gente tem que ficar tão preso também ao Brasil?”. De acordo com o Raphael, a curadoria no país é muito autocentrada. O que, para ele, não é um problema, mas o curador procurou trazer essa diversidade de nacionalidades que chegam com uma abrangência de estilos e artes. “Na Bienal você tenta ter uma série de cruzamentos e presenças, mas ela é uma edição de uma coisa só, e na próxima edição vem um outro curador com outro interesse e dá um outro recado”.

Outro transeunte que observava as obras, Bernardo Daiello, contou que está gostando muito da Bienal e que sempre que consegue, ele comparece nas Bienais. Bernardo, um visitante assíduo, fala: “Eu sempre acabo sendo surpreendido. Eu gosto principalmente desse elemento. A Bienal, cada uma é muito única, então eu até busco não me informar tanto para ir vendo no momento o que cada exposição vai trazer para mim.”

(Reprodução/Pedro Pereira)

Espaços da Bienal

O evento reúne uma ampla variedade de espaços culturais onde as obras serão expostas para o público, dentre eles: museus, centros culturais e fundações, também chamados de “Estalos”. Além do Farol Santander, que reabre as portas pela primeira vez depois das enchentes, do Museu de Arte do Rio Grande do Sul e da usina do Gasômetro, nesta edição, a Bienal ocupa espaços na Cinemateca Capitólio, no Pop Center, no Museu do Hip Hop e na Fundação Vera Chaves Barcellos. Essa diversidade de territórios remete à transformação, ao “zigue-zague” de experiências, explorando geografias que remetem ao nome Estalo.

(Reprodução/Malu Gomes)

Bienal: uma história de 30 anos

A história da Bienal do Mercosul iniciou em 1995, com diversos propósitos, entre eles, a busca de uma maior troca entre os países da América Latina e a oportunidade de investimento na área das artes. Foi somente em setembro de 1997 que a primeira exposição nasceu, com o auxílio de uma lei de incentivo à cultura, criada na época. A mostra também se preocupa há anos com a formação de arte-educação dos visitantes, que podem participar de projetos educativos. Mais uma vez, a Bienal oferecerá espaços de imersão e experimentação, criando uma ponte entre o patrimônio cultural e o público, como seminários, rodas de conversa e cursos de formação.

Mais de 1.900 artistas já passaram pelos espaços de Porto Alegre. Entre os talentos homenageados, estão o argentino Xul Solar e os brasileiros Iberê Camargo, Rafael França, Saint Clair Cemin, Amílcar de Castro, Jorge Macchi, Öyvind Fahlström e Francisco Matto

Na abertura, o time do Lab J pôde acompanhar de perto o início desse evento incrível, no espaço do Farol Santander. Lá, onde diversas obras se encontram e se misturam, o artista do Rio de Janeiro,  Dery Ferreira, observava a exposição do artista paraguaio Ogwa, que pertencia à nação indígena Ishir, no Norte do Paraguai. A obra apresenta desenhos simples mas que, de acordo com Dery, são extremamente complexos. “É como se fosse um sonho, é como se ele desenhasse os sonhos dele. Só que é como se fosse um desenho de criança, mas, ao mesmo tempo, eles são extremamente complexos.” Ogwa consegue simplificar suas ideias em forma de rabiscos, assuntos sérios em traços curtos. O carioca que observava atento a exposição comentou que também era artista e que está apresentando, no Clube do Comércio, uma exposição de arte chamada “Fragmentos do Tempo”. O artista acrescenta: “É uma obra que trata, justamente, das relações humanas hoje com o tempo. Mas não o tempo cronológico. O tempo que se dilui.”

O LabJ fará a cobertura completa da Bienal, trazendo conteúdos e reportagens especiais sobre os assuntos que permeiam o evento. Parte dessa cobertura é o “Estalo”, podcast que conta os detalhes e vai deixar você por dentro de tudo o que acontecerá nesta edição. O episódio piloto foi lançado hoje, com os convidados  Fernando Bakos, coordenador do curso de Design da Famecos, Roger Lerina, jornalista cultural, e Raphael Fonseca, curador-chefe da Bienal.

Serviço: 14ª Bienal do Mercosul (27/3 à 1/6 )

Espaços: CCMQ, Centro Cultural Vila Flores, Cinemateca Capitólio, Espaço Força e Luz, Estação Cidadania Lomba do Pinheiro, Estação Cidadania Restinga, Farol Santander(vai reabrir com a bienal depois da enchente) , Fundação Ecarta, Fundação Iberê Camargo, Fundação Vera Chaves Barcellos, Goethe-Institut POA, Instituto Ling, Museu da Cultura Hip Hop RS, Museu de Arte Contemporânea do RS(MAC-RS), Museu de Arte do Rio Grande do Sul(MARGS), Museu do Trabalho, Pop Center e Usina do Gasômetro.

Site da Bienal: https://www.bienalmercosul.art.br/ 

Lista de artistas: https://www.bienalmercosul.art.br/bienal-14-artistas